quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Nunca tive tanta vontade de o fazer como agora. É uma espécie de auto-apelo, um grito que não se pode expressar por estar emaranhado nas regras e nos princípios politicamente correctos que reinam os nossos dias. É das tais coisas que só podemos sonhar enquanto estamos dentro do carro e vemos as imagens a passar a velocidades loucas; ou enquanto estamos na cama e tudo permanece imóvel à nossa volta. Tudo demasiado silencioso, tudo demasiado escuro.
O que eu gostava mesmo era de largar esta minha vida. Despir a minha pele, arranjar (ainda) mais vontade de viver e partir à procura de simplesmente nada, nada apenas. Adorava acordar um dia e pensar: é hoje; pegar numa mochila, enchê-la com alguma roupa, o meu ipod, a minha máquina fotográfica, um caderno, uma caneta, infiltrar-me num comboio e ir. Ir correr o mundo, conhecer novas pessoas, esquecer aquilo que sou e aquilo que fui. Perder-me para me encontrar... Deveria ser das melhores sensações que algum dia podia sentir: a força da liberdade.
Seria tão bom poder completar os vazios que se alojaram no meu corpo. Se passasse por todas essas vivências teria a oportunidade de os encher com cultura, com conhecimento, com cores e cheiros, com vida. Deixava de me sentir vazia, como me sinto agora. Deixava de me sentir incompreendida e podia, finalmente, ver a vida com um outro olhar. (Seria tão empolgante rebolar por aquelas enormes colinas de um verde saboroso, correr em círculos, cega de entusiasmo, em redor de bandos de pássaros e à noite mastigar o luar.) Hoje estar em Roma, amanhã em Marrocos e no dia seguinte em Sidney. Percorrer cada recanto do mundo, seria como percorrer cada linha do meu corpo. Uma eterna descoberta sobre mim mesma, uma procura de quem são os meus compatriotas, de qual é a minha origem. Penso que seria uma enorme vitória sobre mim própria, pois tinha conseguido vencer o que já me estava predestinado.
Só que os sonhos... Os sonhos são traiçoeiros, pois não passam de protótipos de uma realidade ambicionada. De inocentes desejos que, embora que seja por breves momentos, me acolhem numa felicidade ilusória e me trazem quem o meu coração guarda, para partilhar esse mesmo sonho comigo. E este não foi excepção.


Um derradeiro sonhador, como eu, passa os dias inteiros a sonhar. Sonha tão alto que quando se apercebe, a sua cabeça já paira em Marte. Só que estes sonhos já se andam a adivinhar há muito e, por isso, fica aqui a promessa: um dia vou a Marte, mas não durante um sonho.

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